sexta-feira, 19 de abril de 2024

A Mocidade Militar da Praia Vermelha no Rio de Janeiro

 Qual Foi a Relação da Mocidade Militar Com a Queda da Monarquia no Brasil? Por Que a Escola Militar do Rio de Janeiro Era Chamada de “O Tabernáculo da Ciência”? Em Que se Baseava o Sistema Filosófico – o “Positivismo” – de Auguste Comte?





 Ao desembarcar no Rio de Janeiro em 1879, o estudante cearense José Bevilácqua ficou deslumbrado com os bondes puxados a burro, com as elegantes vitrines das lojas da Rua do Ouvidor e com os cafés, onde se reuniam políticos e intelectuais da época. Numa carta aos pais, contou ter achado tudo muito bonito e admirável: _ “O Rio de Janeiro é o Brasil, e a Rua do Ouvidor é o Rio de Janeiro! ”.

Com apenas 17 anos, Bevilácqua vinha de uma pequena cidade do interior cearense, onde sua mãe era professora primária e o pai mestre de obras. Naquela época, filhos de famílias pobres só tinham duas alternativas para fazer um curso superior; ser padre ou militar.

Daí primeiro ele foi seminarista em Belém e, ao perceber que não tinha vocação religiosa, sentou praça no Exército – pré-requisito para ingressar na Escola Militar da Praia Vermelha. Essa decisão o lançaria no olho do furacão responsável pela Proclamação da República.

O Rio de Janeiro e a Escola Militar eram o celeiro da “mocidade militar” que prepararia e executaria o golpe contra a Monarquia em 15 de novembro de 1889. Bevilácqua estaria na tropa que nesse dia desfilou pelo centro da capital em comemoração à queda do Império.

A mocidade militar foi o fermento de um bolo ao qual se juntariam mais tarde os demais ingredientes da Proclamação, incluindo oficiais militares veteranos, como os Marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, os fazendeiros paulistas e toda a galeria de jornalistas, advogados e intelectuais republicanos.

As relações pessoais desse grupo eram tão estreitas que Bevilácqua viria a ser genro de Benjamin Constant, professor da Escola Militar e mentor intelectual desse grupo de jovens. Também colega de Bevilácqua, o fluminense Euclides da Cunha – futuro jornalista, escritor e autor do clássico “Os Sertões” – casaria com a filha do Major Sólon Ribeiro, igualmente integrante do grupo.

Na Escola Militar estudava-se muito e o currículo incluía álgebra, geometria analítica, cálculo diferencial, física experimental, química orgânica, trigonometria esférica, ótica, astronomia, geodesia, desenho topográfico, tática, estratégia e história militar, direito internacional, noções de economia política e arquitetura civil e militar.

Era ali que os estudantes vindos dos mais diferentes pontos do país, entravam em contato com as ideias que, naquele momento, germinavam revoluções ao redor do mundo. Por isso, a escola era chamada de “O Tabernáculo da Ciência”. Seus alunos se identificavam como “os científicos”, homens contaminados pelo “Século das Luzes”, imbuídos da missão de entender e transformar o mundo.

Nenhum pensador teve tanta influência sobre a “mocidade militar” do RJ quanto o francês Auguste Comte, considerado o “pai” do positivismo – conjunto de ideias que seduziu toda uma geração de intelectuais brasileiros na segunda metade do século XIX. Comte apoiava os ideais da Revolução Francesa, que incluíam o fim da Monarquia, a ampliação dos direitos individuais, a separação entre Estado e religião, mas assustava-se com o caráter sanguinário que a revolução tinha adquirido.

Após a revolução, a Monarquia e a República foram derrubadas e restauradas na França inúmeras vezes, sempre em meio a novos banhos de sangue. O Regime do Terror havia dado lugar às guerras napoleônicas, nas quais os franceses tentaram impor as ideias que a revolução falhara em implantar nas assembleias populares.

Após a derrota de Napoleão em 1815, reis e governantes civis se revezaram no poder por mais de ½ século, até 1870 – ano da consolidação da República na França. Cada fase vinha com novas receitas para velhos problemas e as ideias de Comte – resultado de sua experiência pessoal – procuravam dar ordem ao caos instalado no continente europeu nessa ocasião.

O positivismo de Comte baseava-se em um sistema filosófico (a “Lei dos Três Estados”), onde o ser humano passaria por 3 etapas de evolução. A 1ª seria a fase teológica, onde as pessoas tentariam explicar os mistérios da natureza através da crença na ação dos espíritos e elementos mágicos.

Sociedades ainda presas à essa fase aceitariam a ideia de que a autoridade dos Reis e o poder do Estado teriam uma origem divina – decorrentes de uma delegação sobrenatural. Portanto, a Monarquia seria o regime de governo natural de um estágio primitivo na evolução humana, mais próximo da barbárie do que da racionalidade.

A 2ª fase seria a metafísica, onde a imaginação daria lugar à argumentação abstrata. Nesse patamar estariam os filósofos gregos, os quais passaram a usar a razão para explicar os fenômenos naturais. Em decorrência dessa mudança de foco, a organização e o governo das nações passariam a basear-se na soberania popular, não mais em uma suposta origem divina. Este seria um estágio intermediário, no qual os seres humanos ainda não teriam acesso ao instrumento mais fundamental na aquisição do conhecimento – o método científico.

A ciência só passaria a orientar o entendimento humano na fase seguinte, a 3ª na escala de valores de Auguste Comte, a qual ele denominou de “científico” ou “positivo”. Era para esse terceiro estágio que boa parte dos seres humanos se encaminhava no século XIX – pelo menos nas sociedades que ele julgava mais desenvolvidas, como era o caso dos países europeus.

Essa noção estaria na base da moderna Sociologia, ciência da qual Comte é considerado fundador. Dela resultou também a expressão “Ordem e Progresso”. No pensamento do filósofo francês Auguste Comte estava a gênese de outro conceito que moveu as paixões dos “científicos” da Escola Militar da Praia Vermelha: – o da ditadura republicana.

A tarefa de reformar a sociedade – segundo sua proposta – deveria ser levada a cabo por uma elite intelectual situada na vanguarda dos 3 estágios evolutivos. Portanto, a República deveria ser implantada de cima para baixo, de forma a prevenir insurreições populares que pudessem ameaçar a boa marcha dos acontecimentos.

Na segunda metade do século XIX o positivismo já estava em decadência na Europa, tanto como religião quanto como sistema filosófico. No Brasil, chegaria ao apogeu nessa época e seria o germe da transformação ocorrida em 1889 – como demonstra o lema “Ordem e Progresso” inserido na bandeira nacional. A primeira agremiação positivista brasileira foi criada no Rio de Janeiro em 1876 com o objetivo de “promover um curso científico” e construir uma biblioteca.

Entre os 7 fundadores estava 2 professores da Escola Militar, o então Major Benjamin Constant e o engenheiro Roberto Trompowsky Leitão de Almeida. Cinco anos mais tarde a agremiação estaria em crise, pois muitos insistiam em transformá-la em Igreja Positivista do Brasil. Benjamin Constant e outros sócios pedira afastamento, discordando dos desdobramentos religiosos das ideias do filósofo francês.

A partir daí a história do Positivismo no Brasil ficou dividida em 2 vertentes; a primeira, religiosa, tornou-se irrelevante. Em 1890 – primeiro ano da República – a “Igreja da Humanidade” contava com apenas 159 adeptos em todo o país ([1]). No entanto, como ideologia política, as ideias de Comte teriam enorme impacto na história republicana.

E alguns chegaram a estabelecer ligações entre elas e a Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas – ex-adepto do Positivismo. Da mesma forma, haveria no golpe militar de 1964 um eco positivista tardio, tão arraigado no pensamento militar estaria a ideia de um grupo capaz de conduzir ditatorialmente os rumos da instável República brasileira.

Os jovens “científicos” da Escola Militar se declaravam ateus ou agnósticos e, para eles, o desafio da reforma das instituições incluía mudar a própria religião católica – tida como uma das razões do atraso brasileiro. Em 1886, Lauro Sodré fundou em Belém o primeiro clube republicano do Pará, cujo objetivo seria “a eliminação da realeza que, para nós, representa a causa do nosso atraso”.

A propagação dessas ideias em um país católico e conservador gerava desconforto e preocupações e, o melhor exemplo disso, é o episódio envolvendo o cearense José Bevilacqua e sua família. Em 1886, quando ele já era um membro das reuniões e sociedades secretas da “mocidade militar”, sua mãe ficou assustada ao saber que o filho iria morar em uma “república” de estudantes.

No Ceará, a menção da palavra república era considerada perigosa. Em resumo, a “república” que tanto assustava a mãe de Bevilacqua não passava de um alojamento estudantil; mas, era justamente em locais como esse que germinava (em 1889) a semente da derrubada do Império. E não por acaso se chamavam “repúblicas”.

 

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([1]) COSTA, João Cruz. “O Positivismo na República: Notas Sobre a História do Positivismo no Brasil”. P.48



domingo, 14 de abril de 2024

O Mercantilismo e a Ascensão da Inglaterra na Idade Moderna

 Qual Era a Relação dos Metais Preciosos Com o Poderio Espanhol na Idade Média? Quais as Consequências do Monopólio Espanhol? Quais os Princípios e Tipos de Políticas Mercantilistas da Época?

 



 

No século XVI a Espanha foi o país mais rico e poderoso do mundo e, todas as outras nações, julgavam encontrar a razão para isso na obtenção de metais preciosos de suas colônias. Dessa forma, ter grande quantidade de ouro e prata deveria ser a fórmula da riqueza. Mas, como atingir tal objetivo?

A solução encontrada pelos estudiosos foi a de adotarem políticas econômicas que consistiam numa série de medidas aplicadas pelo Estado, todas elas com a finalidade de conseguir grandes quantidades de ouro e prata para o Tesouro e, ao conjunto dessas medidas, deu-se o nome de Mercantilismo.

Os governos acreditavam nisso e uma das primeiras medidas foi a de proibir a saída desses metais e, em função disso, cada país estabeleceu as medidas mais convenientes aos seus interesses. Por isso, as práticas mercantilistas jamais assumiram a coerência de um sistema. Foram tendências e expedientes adotados pelos Estados Nacionais. Na Espanha baseava-se essencialmente no acúmulo de estoques metálicos em barra. No entanto, como fariam os outros países?

A solução seria o comércio exterior; tomando sempre o cuidado de vender mais do que compravam. Isto é, exportar mercadorias de valor e importar apenas o que fosse necessário e receber o saldo em dinheiro. Mas, o que seria exportado?

Cada país adotou medidas próprias, embora a maioria tenha optado pelos produtos manufaturados. Era importante estimular as indústrias, pois os produtos tinham mais valor que os da agricultura. Daí, cada Estado procurava adotar como linha de ação as medidas tomadas pela maior potência da época.

Mas, todos os países partiam do pressuposto de que ser rico era possuir grandes quantidades de ouro e prata, acreditando também que a riqueza de uma nação implicava a miséria de outra – pois as possibilidades de comércio eram limitadas.

Na prática, os comerciantes e os respectivos Estados empreenderam um comércio monopolista, acarretando guerras frequentes. O Mercantilismo levou à formação de um sistema colonial em que a exploração das colônias vinculava-se à acumulação de capitais, tanto da burguesia que se beneficiava do comércio colonial monopolizado, como do tráfico negreiro que possibilitava altíssimos lucros.

Portanto, pode-se dizer que o Mercantilismo foi uma política de nacionalismo econômico que se ligou ao surgimento do Estado Nacional Moderno e ao fortalecimento do poder real (Absolutismo).

 

1. Princípios e Tipos de Políticas Mercantilistas

 

Desde a Antiguidade diversos povos adotaram práticas que se tornaram correntes no Mercantilismo, embora somente no século XVI desenvolveram-se princípios cujo conjunto veio a constituí-lo, de fato. Entretanto, as teorias do Mercantilismo só resultaram em medidas práticas através dos chefes de Estado europeus.

Os estudiosos daquela época elaboravam múltiplas considerações sobre a necessidade de incrementar uma política econômica nacional que fosse subordinada aos interesses do Estado. Daí a complexidade e heterogeneidade do Mercantilismo. E, embora não possuísse uma doutrina, essa prática adotou princípios como:

 

·                   O principal meio de conseguir recursos para uma nação carente é o desenvolvimento do comércio.

·                   O saldo da balança de comércio deve ser favorável, a fim de aumentar o acúmulo de metais preciosos.

·                   As colônias devem ser úteis como mercados consumidores e fontes de abastecimento de matérias-primas e metais preciosos.

·                   As colônias só podem abastecer a metrópole a que pertencem, sendo proibidas manufaturas nas colônias, uma vez que concorrem com o artigo metropolitano; todo comércio colonial deve ser monopolizado pela metrópole.

 

Esses princípios converteram-se em doutrinas empíricas de diversos Estados europeus, assumindo características originais. Na Espanha, seus adeptos defendiam o aumento das exportações sobre as importações como um meio de melhorar a estocagem de lingotes de ouro e prata.

Na França foi chamado de Colbertismo – derivada de Colbert, ministro de Luís XIV – defensor do Absolutismo econômico. Todavia, a denominação restringe a amplitude do Mercantilismo francês, dando a falsa impressão de que se limitou ao período de Luís XIV.

Porém, devemos considerar que no século XVI os Estados europeus adotaram determinadas medidas, enquanto nos séculos XVII e XVIII prevaleceram práticas distintas. Assim, no século XVI, considerando que o poderio espanhol se baseava nos metais preciosos provenientes da América Espanhola, prevaleceram as concepções metalistas.

Daí justifica-se a canalização de ouro e prata, ao mesmo tempo em que procurava impedir sua evasão do Estado. Essa política ocorreu principalmente nos Estados Ibéricos, cujo erro básico foi confundir estoque metálico com capital. Sua preocupação levou-os a ver os metais preciosos como “a riqueza das nações”.

Já no século XVII acentuaram-se as preocupações comerciais, donde a ênfase dada ao comércio externo, estimulado mediante a criação de companhias privilegiadas, o incremento à construção naval, a busca de colônias e outras medidas, assim como a Holanda utilizou amplamente.

Na 2ª metade do século XVII os mercantilistas passaram a se preocupar em evitar a “hemorragia financeira” que produzia atendendo ao consumo interno, evitando-se a importação ao mesmo tempo em que se criava um excedente de produção para vender a outros Estados. Daí o cuidado em desenvolver as manufaturas, aplicar um protecionismo que afastasse a concorrência estrangeira e atrair a mão de obra especializada, visando aperfeiçoar as técnicas de produção.

No século XVIII as práticas mercantilistas foram colonialistas, passando a considerar as colônias não só como áreas fornecedoras de matérias-primas e produtos tropicais (cana-de-açúcar), mas como mercados consumidores. As colônias criadas no continente americano podem ser classificadas em dois tipos:

 

·                   Colônias de Exploração: organizadas em função de interesses comerciais metropolitanos. A produção era exportada para a metrópole, a qual forneceria os produtos industriais consumidos pela colônia; a produção colonial deveria se basear na extração de metais ou no cultivo de produtos agrícolas para o consumo metropolitano, ou de alto valor comercial no continente europeu; a impossibilidade de manter o trabalho assalariado levou à utilização do trabalho escravo empregado nas propriedades agrícolas com produção especializada (monocultura). Procurava-se impedir o desenvolvimento de atividades econômicas capazes de concorrer com a produção metropolitana.

·                   Colônias de Povoamento: eram aquelas cuja economia atendia não aos interesses metropolitanos, mas aos dos colonos que emigraram de suas terras por motivos políticos, perseguições religiosas ou impossibilidade de viver em condições econômicas subumanas. Nessas colônias a agricultura fundamentava-se nas pequenas propriedades, trabalhadas pelos próprios colonos que podiam utilizar mão de obra suplementar – assalariada ou não – e o exemplo mais conhecido é das colônias inglesas da Nova Inglaterra.

 

2. O Mercantilismo e o Sistema Colonial Francês e Inglês

 

Foi por causa das colônias de exploração que se formou o sistema colonial na América e, só poderemos entendê-lo, se considerarmos terem sido o resultado da expansão do capital europeu. As colônias foram orientadas por diretrizes que atendiam aos interesses da burguesia mercantil da Europa, associada ao Estado Absolutista que praticava uma política mercantilista com o objetivo de fortalecer-se mediante novas fontes de renda. Essa convergência de interesses esclarece a aplicação do monopólio.

Ao monopolizar a compra dos produtos coloniais a burguesia metropolitana forçava sua baixa permitindo-lhe enormes lucros, pois ela vendia esses produtos a preços de mercado na Europa. Dessa forma, o Estado assumia – no sistema – o papel fiscal, fortalecendo-se e garantindo o funcionamento do sistema.

Coerentes com as concepções mercantilistas as potências europeias buscaram criar impérios coloniais, a fim de conseguir os produtos que careciam e de escoar o excedente através de um rigoroso monopólio comercial. De acordo com os princípios mercantilistas, eles não visavam colonizar as conquistas ultramarinas, mas limitar-se a ocupações periféricas através de feitorias onde eram acumulados os produtos comercializáveis. Na prática as contingências históricas determinaram variações da teoria, como foi o caso da colonização do Brasil pelos portugueses que foi realizada sob iniciativa privada, inclusive com experiência de governos próprios e ampla autonomia.

A política mercantilista francesa variou segundo as concepções empíricas dos seus executores. Assim, ministros de Henrique IV defenderam o incremento à agricultura e à indústria, a fim de evitar a entrada de mercadorias estrangeiras e a saída de metais preciosos. Com esse objetivo desenvolveram novos cultivos (amoreira, por exemplo), diversas manufaturas (tapete, seda e vidro), enquanto aperfeiçoaram as comunicações internas construindo canais e melhorando as estradas.

Assim, Richilieu enfatizou as atividades comerciais, aumentando as exportações sobre as importações a fim de conseguir recursos para o Estado: daí o impulso dado à construção naval, à expansão colonial, à melhoria dos portos e à organização de companhias de comércio. Mas, foi com Colbert que a política mercantilista se desenvolveu de forma mais sistemática, melhorando a economia francesa através de uma severa intervenção estatal, protegendo as atividades econômicas e, particularmente, as indústrias.

Daí a criação das manufaturas reais, a abolição de impostos, aduaneiros internos, os regulamentos visando a produção de artigos de luxo, a proteção à construção naval, o incentivo à vinda de mão de obra especializada (artesãos flamengos, por exemplo), as concessões às companhias de comércio (com privilégios fiscais e monopólios), a elevação de impostos de importação (a fim de afastar a concorrência estrangeira), a intensificação da colonização na África (Senegal) e na América (Guiana, Luisiana e Canadá). Graças a tudo isso a França se tornou famosa pela produção de artigos de luxo (joias, móveis, porcelanas e sedas).

Quanto à política mercantilista inglesa seus primórdios datam da ascensão dos Tudor (destacando-se Henrique VII, Henrique VIII e Elisabete I). Data desse período o desenvolvimento marítimo da Inglaterra – favorecido pelas “Leis de Navegação” – e das atividades industriais, favorecidas pelos monopólios e pela existência de mão de obra qualificada.

Esse período apresentou progressos na área metalúrgica, extrativa e de produção de tecidos de lã. Além disso, a Inglaterra beneficiou-se com o comércio exterior graças à intensificação das operações dos piratas, ao contrabando e a conquista de colônias na África (Tanger, Gâmbia, etc.), na América (Bahamas, Jamaica e Canadá) e Ásia (Índia).

Assim, suas estruturas políticas e socioeconômicas se fortaleceram pelas transformações internas e pela hábil política externa que possibilitaram a superação da Espanha, da Holanda e da França, tornando a Inglaterra a maior potência mundial dessa época.


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sexta-feira, 12 de abril de 2024

A REVOLUÇÃO CIENTÍFICA no SÉCULO XVII

 

O Que Significam Teocentrismo e Antropocentrismo? O Que é Um Método Científico? Qual a Relação Entre a Razão, a Fé e a Ciência?

 




Quando falamos em “Revolução Científica” estamos nos referindo às mudanças significativas na estrutura do pensamento que, em uma determinada época, repercutiram no plano científico.

Mas, quando queremos compreender qualquer fenômeno, devemos proceder a uma atenta observação para posterior análise desse fenômeno. E, para tal, devemos estabelecer um método de ação que seja científico.

E o que faz um método se tornar científico? Ele deve apresentar todo um círculo racional e lógico, adotando uma determinada forma de tratar o objeto de estudo e isso deve obedecer a certa sequência de procedimentos. Daí, temos as fases de observação, análise, formulação de hipóteses, experimentação, verificação das hipóteses e conclusões.

A frase de Shakespeare – “Que obra de arte é o homem” – evidenciava uma mudança na estrutura mental daquela época, pois a visão de mundo da Idade Média pela relação Deus-Homem estava sendo substituída pela relação Homem-Natureza.

Era a passagem do Teocentrismo para o Antropocentrismo e, dessa forma, ao captar seu objeto o homem deveria formular hipóteses e experimentá-las a fim de certificar sua validade.

Em verdade, somente a Razão poderia encontrar meios de explicar os principais fenômenos da Natureza que a Escolástica – associada à Fé e a razão através da lógica Aristotélica – não poderia explicar.

Assim, os primeiros pensadores dessa época – Kepler e Galileu – tiveram sérios choques com o sistema Aristotélico, que ainda predominava e servia de base para o pensamento teológico. Dessa forma, conceber a Natureza em constante movimento implicava perceber as instituições sociais como suscetíveis de mudanças.

 

Os Métodos e as Descobertas Científicas

 

Foi no século XVII que assistimos à afirmação da ciência experimental, onde a atividade científica não mais se resumia a observar os fenômenos – partindo de dados empíricos para os princípios eternos (Deus) –, mas em tentar descobrir e explicar os fenômenos e as leis que constituíam a Natureza.

Sendo assim, pode-se afirmar que, no referido século, assistimos de fato a explicações racionais do Universo, submetido a leis físicas e naturais e não a princípios metafísicos e divinos. Essa ruptura deveu-se muito a três (3) filósofos:

 

·                     Francis Bacon: Escreveu “O Progresso do Conhecimento” que defendia o valor das experiências de laboratório e do método indutivo, em que o conhecimento é adquirido partindo-se da observação a fim de atingir uma verdade. Embora não fosse o descobridor do método indutivo, ele valorizou-o como fundamental para a exatidão do conhecimento.

·                     René Descartes: Autor de “Discurso Sobre o Método” que demonstrava que tanto a opinião tradicional como as experiências comuns da humanidade eram guias de mérito duvidoso. Diante disso, adotou novo método isento da influência de ambos que consistia em começar com verdades simples – como as da Geometria – e depois raciocinar com base nelas, até chegar a conclusões particulares.

·                     Isaac Newton: Escreveu “Princípios Matemáticos de Uma Filosofia da Natureza”, partindo de estudos de Galileu e Kepler e demonstrando matematicamente que as leis físicas aplicáveis na Terra também se aplicavam a todo o Universo. Estava dado o golpe final à concepção medieval de um Universo guiado por intenções benévolas.

 

Baseada na experimentação e na dedução matemática, a ciência fez grandes progressos na física, na matemática, astronomia, química e biologia. Pois foi no século XVII que se construiu a física moderna que, através de Newton, sistematizou-se a interpretação física do Universo (Teoria da Gravitação Universal), elaborou conceitos básicos (massa, força, inércia, movimento, tempo) e pesquisas para o estudo da luz (análise espectral), além de ter lançado as bases da astronomia.

Dessa forma, William Gilbert descobriu as propriedades do IMÃ, o alemão Gottfried Leibnitz provou que o tempo e o espaço eram relativos e o dinamarquês Roemer calculou a velocidade da luz.

Na Astronomia, o italiano Galileu Galilei construiu o 1º telescópio e descobriu os satélites de Júpiter, as manchas solares, os anéis de Saturno e as fases de Vênus, deduzindo que a Terra gira sobre si mesma. Johann Kepler usou métodos comparativos – e conhecimentos matemáticos – para comprovar e ratificar a Teoria Heliocêntrica (onde os planetas descrevem órbitas elípticas em que o Sol é o centro de todo o sistema).

As Ciências Matemáticas sofreram enormes transformações, quando surgiu a Geometria Analítica com Descartes, o Cálculo Diferencial com Newton, o Cálculo das Probabilidades com Pascal e o Cálculo Infinitesimal com Leibnitz.

A Química foi desenvolvida principalmente por Robert Boyle, apontado como fundador da química moderna, pois iniciou a Química Orgânica e estabeleceu uma nova distinção dos compostos, classificando-os em “ácidos” e “sais”.

Portanto, pode-se afirmar que essas descobertas romperam com as concepções de Aristóteles – ainda vigentes e defendidas pela Igreja – e o cosmo, hermético e hierarquizado, foi substituído pelo Universo, aberto e infinito, porém, ligado pela unidade de suas leis.

Em última análise, a concepção de um mundo imóvel foi suplantada pela concepção de que o Universo estava em movimento; isto é, contra os princípios baseados na tradição e que serviam de base à imobilidade das instituições, firmavam-se as noções de que a Natureza – e tudo o que nela se encontrava – estava em movimento, este significando progresso.


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sexta-feira, 5 de abril de 2024

As Artes Perdidas da Memória Com a Chegada dos Primeiros Livros Manuscritos

 

Por Que Durante Milênios a Memória Reinou Sobre a Informação? Que Proezas da Memória Sêneca Era Capaz de Reproduzir? Qual Foi a Contribuição de Giordano Bruno Para a Ciência Mnemônica?




 

 Antes do livro impresso, a memória governava a vida quotidiana e o saber oculto da sociedade. Por isso, ele merecia o nome aplicado à impressão: a “arte conservadora de todas as artes”. A memória dos indivíduos e das comunidades transportou conhecimentos através do tempo e do espaço e, durante milênios, a memória pessoal reinou sobre o entretenimento e a informação, sobre a perpetuação e o aperfeiçoamento dos ofícios, a prática do comércio e sobre a conduta das profissões.

Pela memória eram reunidos, conservados e armazenados os frutos da educação, pois a memória era uma faculdade que todos tinham de cultivar de modos e por razões que nós esquecemos há muito tempo. Nesses últimos 500 anos, vemos apenas tristes relíquias do império e do poder da memória.

Diz-se que o inventor da arte mnemônica foi o versátil poeta grego Simônides de Ceos, o qual também tinha a fama de ter sido o primeiro a aceitar pagamento pelos seus poemas. As origens dessa fama foram descritas na obra sobre oratória de Cícero, ele próprio também famoso pelas faculdades mnemônicas.

Na Idade Média formulou-se distinção entre a memória “natural” – com a qual todos nós nascemos e exercitamos sem treino – e a “artificial”, a qual podemos desenvolver. Havia diferentes técnicas para memorizar coisas ou palavras, pois alguns professores aconselhavam o estudante a procurar um lugar sossegado onde suas impressões imaginadas não fossem enfraquecidas pelos ruídos ou passagem de pessoa.

Sêneca, o mais velho professor de Retórica, tinha fama de ser capaz de repetir extensas passagens de discursos que ouvira apenas uma vez, muitos anos antes. E impressionava seus alunos pedindo que cada recitasse um verso e, depois disso, ele próprio recitava os versos na ordem inversa. Santo Agostinho confessou a sua admiração por um amigo que conseguia recitar de cor todo o texto de Virgílio – de trás para frente.

As proezas e as acrobacias da memória “artificial” gozavam de grande fama e Ésquilo dizia que “a memória é a mãe de toda a sabedoria”. Cícero concordava, dizendo que a memória era “o tesouro e o guardião de todas as coisas” e, no apogeu da memória, antes da expansão da imprensa, o animador, o poeta, o cantor, o médico, o sacerdote e o advogado precisavam de uma memória bem desenvolvida.

As primeiras grandes epopeias da Europa foram conservadas e realizadas pelas artes da memória e, Ilíadas e Odisseia, por exemplo, foram perpetuadas de forma verbal, sem o uso da escrita. A palavra usada por Homero para poeta é “cantor” e, antes de Homero, cantor era aquele que cantava um único poema breve o suficiente para poder ser cantado a uma única audiência de uma vez.

Os primeiros livros manuscritos do Mediterrâneo eram escritos em folhas de papiro coladas umas às outras e enroladas em seguidas que, além de ser pouco prático, o frequente desenrolar ia delineando as palavras escritas. Como não havia “páginas” numeradas separadas, era trabalhoso confirmar uma citação que as pessoas tinham tendência para confiar na sua memória.

As leis foram conservadas pela memória antes de o serem em documentos e, pode-se dizer que, a memória coletiva da comunidade foi o 1º arquivo jurídico. O ritual e a liturgia foram igualmente conservados pela memória, da qual os sacerdotes eram os zeladores especiais. Os serviços religiosos eram formas de gravar preces e ritos na memória da juventude da congregação.

O predomínio do verso e da música como instrumentos mnemônicos atesta a importância da memória no tempo anterior aos manuais impressos. Aos filósofos medievais não bastou que a memória fosse uma mera faculdade prática e, por isso, transformaram-na de faculdade em virtude, num aspecto da virtude da prudência. S. Tomás de Aquino – por exemplo – decorava tudo quanto os professores lhe diziam na escola e, as palavras que os doutores da Igreja que ele reuniu para o Papa Urbano IV, acabaram sendo registradas não a partir do ele copiara, mas sim do que ele vira. Claro que se lembrava perfeitamente de tudo quanto jamais lera.

A “Divina Comédia” de Dante, deu vida tanto a lugares como a imagens por uma ordem facilmente recordada. Mas, também houve exemplos mais modestos, pois os manuscritos dos frades ingleses no século XIV descreviam cenas que não eram destinadas a ser vistas com os olhos, mas sim a fornecer imagens invisíveis à memória.

Petrarca (1304/1374) teve grande fama como autoridade em memória artificial e no modo de cultivá-la. Ele ofereceu suas próprias regras para escolher os “lugares” onde armazenar imagens lembradas para recuperação. Ele disse que a arquitetura imaginada da memória devia fornecer lugares de armazenamento de tamanho médio, nem demasiado grandes nem pequenos demais para imagens específicas.

Quando a imprensa tipográfica apareceu, as artes da memória tinham sido organizadas em vários sistemas e, em princípios do século XVI, a obra mais conhecida era um texto prático que teve muitas edições e foi muito traduzido. Nesse manual popular, Pedro de Ravena dizia que os melhores locais da memória se encontravam numa igreja deserta.

Depois de Gutenberg os reinos da vida quotidiana passariam a ser governados pela página impressa e, no fim da Idade Média, os livros manuscritos tinham constituído um auxiliar da memória para a pequena classe letrada. Mas o livro impresso era muito mais portátil, mas exato, mais prático de referenciar e evidentemente mais público e comum.

Fosse o que fosse que se imprimisse, depois de escrito por um autor, tornava-se também conhecido dos impressores e de todos aqueles que a página impressa alcançasse. Agora, um homem podia referir-se ás regras de gramática, aos discursos de Cícero e aos textos teológicos, direito canônico e moralidade, sem ter de armazená-los dentro de si.

Depois do século XII alguns livros apresentavam listas, cabeçalhos e até índices rudimentares, sinal de que a memória começou a perder parte do seu antigo papel. Mas, a recuperação se tornou ainda mais fácil quando os livros passaram a ter “rostos” e páginas numeradas. Quando apresentavam índices, então a única proeza essencial da memória consistia em decorar a ordem do alfabeto.

Antes do fim do século XVIII, o índice alfabético no fim de um livro se tornou padrão. A tecnologia da recuperação da memória passou a desempenhar um papel muito menor nos reinos superiores da religião, do pensamento e do saber. As proezas espetaculares de memória se tronaram meros malabarismos.

O mais extraordinário explorador do continente negro da memória foi Giordano Bruno (1548/1600) que, quando ainda era um jovem frade em Nápoles, sentiu-se atraído para a arte da memória dominicana e, quando abandonou a Ordem Dominicana, leigos esperaram que revelasse os segredos dominicanos.

Não os decepcionou, pois na sua obra Bruno explicava que a faculdade da memória não era nem natural nem mágica, mas antes o produto de uma ciência especial. Ao apresentar a sua ciência-memória, demonstrou a potência peculiar das imagens dos decanos do zodíaco. As imagens estrelares, sombras de ideias, representando objetos celestes, estão mais próximas da realidade duradoura do que imagens deste mundo transitório cá de baixo.

Mas, as necessidades quotidianas da memória nunca foram tão importantes como no tempo anterior ao papel e aos livros impressos. A glória da memória declinou e, em 1580, Montaigne declarou que “uma boa memória está geralmente aliada a um fraco discernimento”. E, alguns sábios, diziam ironizando que “não há nada mais comum do que um idiota com uma memória forte”.

Nos séculos pós-imprensa o interesse passou da tecnologia da memória para a sua patologia. Em fins do século XX, o interesse pela memória foi destronado pelo interesse pela afasia, amnésia, hipnose e pela psicanálise. O interesse pedagógico pelas artes da memória acabou sendo substituído pelo interesse pelas artes de aprender, que passaram a ser descritas com crescente persistência, como um processo social.



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quarta-feira, 27 de março de 2024

A Guerra de Secessão e a América Espanhola no Século XIX

 

Como Ocorreu a Guerra de Secessão nos EUA? Quais Eram as Condições Econômicas dos Estados do Norte e do Sul? O Que Foi a Idade do Ouro Americana?

 



 

Em 1860 a burguesia dos Estados do Norte no atual território dos EUA tinha consciência de que o domínio de dois litorais (Atlântico e Pacífico), a existência de um mercado interno, o aperfeiçoamento dos meios de transporte, a entrada de mão de obra especializada e de capitais europeus possibilitariam as condições necessárias para o desenvolvimento econômico e maior atuação na política internacional.

Mas, um dos problemas era a falta de integração, pois os Estados do Sul e do Norte tinham maneiras de pensar diferentes. No Norte havia lavoura em pequena escala, o transporte por navios, as manufaturas que cresciam, tudo sendo produzido pelo trabalho do branco. No Sul havia a monocultura com o trabalho do negro, as classes proprietárias sulistas eram partidárias do livre-cambismo e opondo-se ao protecionismo alfandegário.

Para os sulistas era questão fundamental vender – no exterior – os produtos agrícolas e adquirir de clientes ingleses os produtos fabris que necessitassem; isto, sem esquecer que seriam obrigados a comprar produtos nacionais a preços altos e de qualidade inferior aos produzidos no exterior.

Em contraposição, a burguesia nortista considerava que suas nascentes indústrias só teriam condições de se desenvolver mediante tarifas protecionistas que afastassem a concorrência europeia e garantissem o consumo de um mercado interno em plena expansão.

Além disso, os fabricantes e comerciantes nortistas estavam interessados em estreitar as relações com o Oeste, vendendo-lhes artigos industriais e comprando produtos agrícolas. Por isso, eles apoiavam as reivindicações do Oeste no sentido de que a União deveria promover a construção de ferrovias e canais, ligando o Oeste ao Leste e isso era contestado pelos proprietários sulistas.

As divergências eram complicadas pela questão da escravidão, que era considerada de forma diferente entre nortistas e sulistas. Para a burguesia do Norte a abolição da escravidão era interessante porque representava a ampliação do mercado consumidor interno. A campanha antiescravista ganhou impulso não apenas pelo fato de as tendências liberais se terem avivado ao Norte, mas também pelo desenvolvimento dos movimentos humanitários ligados às teorias sociais e aos “socialistas românticos”.

Portanto, foi nesse ambiente conflitante que surgiu o novo Partido Republicano (1854), agrupando democratas e federalistas do Norte, do Oeste e até do Sul, nacionalistas e protecionistas, apresentando Abraham Lincoln como candidato às eleições de 1860. A vitória de Lincoln levou a Carolina do Sul a proclamar a dissolução da União entre esse Estado e os demais, apoiada por mais dez Estados que formaram os Estados Confederados da América.

Sendo assim, o ataque confederado ao Forte Sumter deu início às operações militares da “Guerra de Secessão”, a qual foi considerada a 1ª das grandes guerras modernas, não só pelas enormes perdas humanas (620 mil) como também porque foi uma “guerra total” – devido à utilização de todos os recursos políticos, militares, econômicos e psicológicos empregados contra os exércitos e as populações civis.

A União compreendia 23 Estados com cerca de 28 milhões de habitantes e, os Confederados, tinham 11 Estados com uma população de 9 milhões dos quais 3,5 milhões eram escravos. O sistema ferroviário da União era mais extenso e de melhor qualidade que o dos Confederados, os quais dependiam de armas e medicamentos importados. Além do mais, os estaleiros do Norte reforçaram sua esquadra cujos navios afundaram os dos Confederados e bloquearam os portos sulistas.

Apesar das várias derrotas da União – devido à incapacidade de seus generais – as desvantagens do Sul foram-se evidenciando e, desde a batalha de Gettysburg, a União começou a avançar e levou o Sul a capitular após a tomada de sua capital (Richmond) em 1865.  No decorrer do conflito, Lincoln aboliu a escravatura a fim de enfraquecer seus inimigos.

Com o fim da guerra surgiu o problema da reconstrução política, socioeconômica e financeira que foi enfrentado também pelos dois presidentes seguintes. Os Estados sulistas foram reintegrados à União, tendo que abolir a escravidão e o direito de voto aos negros. Economicamente, o Sul foi mais afetado pela guerra do que o Norte, pois muitas plantações foram arrasadas e outras confiscadas.

Dessa forma, o Sul foi obrigado a vender os produtos agrícolas aos capitalistas do Norte, os quais se valeram da condição de vencedores para transferir capitais e indústrias para os Estados sulistas. Em contraposição, o desenvolvimento econômico do Norte e do Oeste foi considerável, pois mesmo durante o conflito as necessidades bélicas estimularam a industrialização o que possibilitou a formação dos primeiros trustes – ligados aos Rockfeller’s, aos Carnegie’s e aos Morgan’s.

 

A Idade do Ouro

Após a Guerra de Secessão os EUA conheceram uma crescente prosperidade econômica, pois a produção foi estimulada pelo desenvolvimento das indústrias nortistas, pelo estabelecimento de tarifas protecionistas, pelo afluxo de mão de obra imigrante e também pelo surgimento de uma geração de ousados homens de negócios.

A ocupação de terras do Centro-Oeste acarretou uma extraordinária expansão da agricultura, facilitada pela conquista de terras aos indígenas e pela construção de ferrovias. Mas, foi a indústria que apresentou os mais elevados índices de desenvolvimento sobressaindo-se a produção de aço, onde os EUA atingiram o 1º lugar mundial.

A multiplicação de eventos, a abundância de matérias-primas, o aperfeiçoamento das comunicações, dos transportes e a criação de um sistema bancário nacional favoreceram a industrialização – rapidamente concentrada em impérios econômicos estruturados em trustes e pools.

 

A América Espanhola no Século XIX

 

Apesar dos esforços de Simón Bolívar em criar uma Confederação de Estados Americanos, o projeto que foi a primeira manifestação de Pan-Americanismo fracassou. Para isso contribuíram a oposição do Brasil monárquico (contrário a regimes republicanos), a resistência dos EUA (temiam o contágio de ideias abolicionistas) e a resistência da Inglaterra à formação de uma América forte e unida, que poderia criar obstáculos à expansão econômica inglesa.

A independência da América Espanhola fez-se ao preço de sua unidade, pois em 1831, a Grã-Colômbia fragmentou-se em três repúblicas – Venezuela, Colômbia e Equador – e, sete anos depois, as Províncias Unidas de Centro-América se dissolveram e deram origem às repúblicas da Guatemala, Honduras, El Salvador, Nicarágua e Costa Rica (1838).

Pela ação dos EUA, em 1903 o Panamá separou-se da Colômbia, sem que nos esqueçamos de que o antigo vice-reino do Prata dividiu-se em três repúblicas (Argentina, Paraguai e Uruguai) ao passo que o Peru, a Bolívia e o Chile se tornaram independentes da Espanha e entre si.

Essas guerras haviam desorganizado a economia e consequentemente as minas foram abandonadas, os rebanhos dispersados, a agricultura decaiu – pela falta de segurança e pelas colheitas destruídas – e, não é de se espantar, que os centros urbanos vissem afluir uma multidão de pobres e esfarrapados, buscando alguma ocupação.

A imaturidade na manipulação das instituições políticas levou as novas repúblicas a sangrentas guerras civis e o México –  por exemplo – passou a ter um Presidente por ano (durante 36 anos consecutivos à queda do seu primeiro caudilho). Na Venezuela verificaram-se 52 revoltas em menos de 100 anos e a Bolívia passou a ser o teatro de 60 revoltas militares, mudando 10n vezes sua Constituição, matando ou deixando morrer 6 dos seus Presidentes. Fora o Paraguai, que não conseguia se livrar das ditaduras.

Um dos aspectos desses conflitos foi o choque entre a capital e as províncias, entre as cidades e o campo, entre comerciante e produtor; ou seja, entre os centralistas e os federalistas. Rompidos os vínculos com a metrópole, o poder tendeu a deslocar-se para a classe dos senhores da terra. Daí, a estruturação dos novos Estados foi condicionada por dois fatores: _ a inexistência de interdependência entre os senhores da terra.

Desses conflitos surgiu a controvertida figura do “caudilho”, com forte base rural, índole militarista, o qual arrebatava o poder assegurando a unidade nacional e conduzindo à proliferação de ditaduras. O caudilho lutava pelo poder político central e, muitos contingentes recrutados para a guerra de emancipação, eram constituídos de seguidores de um determinado caudilho.

A carência de capitais – por causa das oscilações políticas e da corrupção administrativa – levou os governantes a contrair empréstimos na Inglaterra que conduziram à crescente dependência econômica aos países desenvolvidos, os quais lhes vendiam produtos industrializados, forneciam técnicos e empréstimos, adquiriam matérias-primas e produtos agrícolas, controlavam as alfândegas estendiam sua influência além do campo econômico.

Sendo assim, esse tipo de relacionamento econômico serve para explicar a existência do subdesenvolvimento como um tipo de fenômeno comum aos países ibero-americanos. A presença inglesa assumia a forma de organização de um comércio importador. Surgiram as casas importadoras que difundiam as manufaturas europeias, que modificaram hábitos de consumo e acarretou a desagregação das atividades artesanais locais.

A Espanha não havia se conformado com a perda de suas antigas colônias e exigiu o pagamento de indenização ao Peru; mas este, aliado ao Chile e à Bolívia, resistiu às pretensões espanholas em uma guerra que se estendeu de 1866 a 1868.

É certo que os criollos ascenderam à condição de aristocracia dirigente e que a expropriação das terras indígena foram incrementadas, mas persistiram as seguintes características: _ as grandes propriedades exploradas por métodos arcaicos; a estrutura social, baseada na posse da terra; as relações de dependência pessoal dos camponeses com relação aos proprietários; a ausência de classes médias rurais; a concentração da propriedade nas mãos de uma minoria; o predomínio da agricultura como atividade econômica e cuja produção destinava-se ao mercado externo.

Daí, no fim do século assistiu-se a um surto da imigração espanhola e portuguesa e, o fato novo, consistiu na chegada maciça de alemães e de italianos. A maioria dos imigrantes acabou se fixando nos centros urbanos, incrementando a urbanização e contribuindo para o desenvolvimento de classes médias (pequenos comerciantes, burocratas) e do proletariado (ferroviários, portuários, etc.) de diversos países, como a Argentina.

Esse quadro foi completado com as guerras entre os países latino-americanos, destacando-se a Guerra do Paraguai e a Guerra do Pacífico, além de inúmeros atritos nas fronteiras porque os limites entre os Estados americanos eram imprecisos.

A Guerra do Paraguai (1864/1870) opôs o Paraguai ao Brasil, Argentina e Uruguai, tendo suas origens no interesse do Brasil em manter um equilíbrio platino, possível com o fracionamento do antigo vice-reino do Prata, mas rompido quando Francisco Solano Lopes procurou converter o Paraguai na Prússia Platina.

Já a Guerra do Pacífico (1879/1833) levou o Chile a enfrentar a Bolívia (aliada ao Peru) em um conflito pela disputa de ricas regiões em prata, fertilizantes e nitratos; os territórios eram bolivianos e explorados por mineiros chilenos, sendo combinado que se pagaria à Bolívia as tarifas de exportações e esta se obrigava a dividir com o Chile.

No entanto, o governo boliviano não respeitou o acordo e acabou confiscando os bens de empresas chilenas, assim como os peruanos haviam feito com as companhias salitreiras chilenas de Tarapacá. O fracasso das soluções pacíficas propostas pelo Chile levou este a iniciar as hostilidades, terminadas com a vitória chilena.


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quinta-feira, 14 de março de 2024

As Transformações na Sociedade Ocidental Ocorridas no Século 13

 

Quais Foram as Primeiras Transformações da Sociedade Ocidental Ocorridas no Início do Século XIII? Que Influências Tiveram a Invenção da Imprensa e a Reforma Protestante de Lutero? É Possível Afirmar Que a Presente Transformação Ocidental Começou Com o Japão, em 1960?

 




A cada dois (2) ou três (3) séculos ocorre na história ocidental uma grande transformação que, em poucas décadas, acaba reorganizando a sociedade na sua visão do mundo, seus valores básicos, sua estrutura social e política, suas artes e suas instituições mais importantes.

Uma dessas transformações ocorreu no século XIII, quando o mundo europeu – quase da noite para o dia – passou a centralizar-se nas novas cidades com o nascimento do comércio a grandes distâncias, com a arquitetura gótica, com a mudança para Aristóteles como fonte de sabedoria e as universidades urbanas substituindo os monastérios, com as novas ordens religiosas (como os dominicanos, os franciscanos e outras). E em poucas décadas com a mudança do latim para o vernáculo e a criação da literatura europeia.

Duzentos anos depois, a transformação seguinte teve lugar entre a invenção da imprensa (Gutemberg, em 1455) e a Reforma Protestante de Lutero (1517). Foram as décadas em que floresceu o Renascimento em Florença e em Veneza; da Infantaria Espanhola (o 1º exército regular, desde as legiões romanas); da redescoberta da anatomia (e com ela a pesquisa científica) e da adoção dos algarismos árabes pelo ocidente. E, mais uma vez, ninguém que vivesse em 1529 imaginaria como era o mundo em que seus avós tinham vivido e no qual seus pais nasceram.

A transformação seguinte começou em 1776 (ano da Revolução Industrial), que foi o ano do aperfeiçoamento do motor a vapor e da publicação do livro “A Riqueza das Nações” de Adam Smith. Ela terminou quase 40 anos depois em Waterloo, durante os quais nasceram todos os “ISMOS” modernos: _ O Capitalismo, o Comunismo e a Revolução Industrial surgiram durante essas décadas que também viram a criação da universidade moderna (Berlim, 1809) e do ensino universal.

Porém, desta vez, a transformação não se limita à sociedade e à história ocidental, pois, na verdade, não existe mais uma história ou uma civilização ocidental, mas sim uma história e uma civilização mundiais. É discutível se a presente transformação começou com o Japão como grande potência econômica – por volta de 1960 – ou com o computador.




Ainda estamos no meio dessa transformação e, se a história servir de guia, ela não estará concluída até 2010 ou 2020. Mas já mudou o cenário político, econômico, social e moral do mundo e ninguém nascido em 1990 poderá imaginar o mundo em que seus avós cresceram ou o mundo em que seus pais nasceram.

A primeira tentativa para compreender os fatos iniciados em 1455 foi feita somente 50 anos depois, com os “Comentários de Copérnico” (1510 / 1514) e com “O Príncipe” de Maquiavel em 1513.

A transformação seguinte – que ocorreu há 200 anos – foi anunciada pela Revolução Americana e só foi analisada sessenta (60) anos depois, nos dois volumes de “Democracia na América” de Aléxis Tocqueville (1835 / 1849).


OBSERVAÇÃO: Já avançamos o suficiente na nova sociedade pós-capitalista para rever a história social, política e econômica da Idade do Capitalismo e da Nação-Estado. Assim, é necessário reexaminar o período que estamos deixando para trás e, deste novo ponto de observação, certamente algumas coisas que veremos no futuro poderão nos surpreender.



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